quarta-feira, 5 de maio de 2010

O APARTHEID MORREU?... - Olimpíada da Geografia

Aqui a discriminação é a lei. Numa África do Sul onde racismo é crime, um povoado se mantém 100% branco e vive como se fosse um país independente. Bem-vindo (ou não) a Orânia

RACISMO

Aqui a discriminação é a lei. Numa África do Sul onde racismo é crime, um povoado se mantém 100% branco e vive como se fosse um país independente. Bem-vindo (ou não) a Orânia

Felipe Lessa, de Orânia, África do Sul

Revista Superinteressante – 04/2010

Quase todos os carros são brancos em Orânia. Já entre os motoristas não existe quase. São todos brancos mesmo. É um povoado de 700 pessoas fundado por brancos e que só aceita moradores brancos. "Viemos atrás do sonho de ter uma comunidade livre e segura. A África do Sul já foi um país de primeiro mundo há algumas décadas, mas infelizmente não podemos mais dizer isso", diz Andries van der Berg, um oraniano de 24 anos.
Andries tem saudade de um tempo que nunca viveu para valer. Tinha só 4 anos de idade quando o apartheid acabou, em 1990. Nos 42 anos que a política de segregação durou, a elite de origem europeia era privilegiada em todas as esferas: tinha os melhores empregos e vivia em bairros nobres com serviços públicos comparáveis aos dos países ricos. Do outro lado dessa muralha invisível estavam 96% da população: negros e mestiços amontoados em periferias ocupando subempregos. Não ser racista era contra a lei, inclusive: o Estado proibia casamentos entre brancos e negros.
Em Orânia os muros também são invisíveis. Não há cancela com seguranças impedindo negros de entrar. Também nem seria permitido. A Constituição sul-africana mais recente, de 1993, transformou o racismo em crime. Se é assim, então, como Orânia é possível? Porque juridicamente esse povoado não é uma cidade. Mas uma empresa. O lugar em si está subordinado a um município de verdade, Hopetown. Não tem prefeito próprio. Mas tem presidente. E os moradores são os acionistas. Ao comprar uma casa lá, você vira sócio. Como qualquer empresa tem liberdade para recusar sócios, Orânia fica com autonomia para decidir quem pode e quem não pode viver lá, como se fosse um governo de verdade.
Isso foi possível porque os fundadores do lugar compraram uma vila operária abandonada no subúrbio de Hopetown - em 1990, logo que o apartheid acabou e Nelson Mandela saiu da prisão. A empreitada custou o equivalente a R$ 1,1 milhão em dinheiro de hoje. Mas isso só valeu pelo terreno, praticamente: eram 240 casas parcialmente destruídas, sem água, luz ou esgoto. "Começamos do nada", diz, orgulhoso, John Strydom, um dos diretores do povoado-empresa.
Empresa não. País. Eles se sentem mais oranianos do que sul-africanos. Como qualquer nação, buscam depender o mínimo possível do exterior. E ter o máximo de autossuficiência econômica. De fato, a maior parte dos serviços e dos alimentos é produzida na própria cidade. Mesmo sem ter nem 15 ruas, Orânia possui bandeira e uma moeda própria: o ora, que vale o mesmo que o rand sul-africano.
É um sistema financeiro engenhoso: você pega seus rands e troca numa casa de câmbio. Ela deixa o dinheiro aplicado. Os rands não são mais seus, a troca já foi feita. Mas você pode sacar os juros depois. Além disso, vários comerciantes dão um desconto de 5% a quem pagar com o ora. É a colaboração deles para criar uma identidade nacional. E para fortalecer a economia local também. Com a moeda local, oraniano gasta com oraniano, não com sul-africano.
"Nosso objetivo é manter o dinheiro dentro da cidade e, com isso, criar empregos", diz Frans de Klerk, o CEO. Não dá para dizer que não deu certo. Em quase 20 anos de existência, foram construídas 3 igrejas, duas escolas, dois museus e uma estação de rádio. E a maior parte dos oranianos tem negócios próprios no povoado, não precisa sair de lá para ganhar a vida.
Mas, cá entre nós, têm de contar com uma mãozinha dos sul-africanos. O posto de gasolina de Orânia, por exemplo, depende dos motoristas negros para sobreviver. Como ele é o único num raio de 15 quilômetros, os habitantes das redondezas abastecem por lá também. Para ter uma ideia, a SUPER viu durante 1h30 só 4 carros com brancos contra 13 com negros. "Sempre passo por aqui e nunca me trataram mal, mas também nunca abriram um sorriso. Lógico, eu estou gastando meu dinheiro no posto. Mas não gosto deste lugar. Nem um pouco", diz a comerciante negra Corina Mathlante.
O isolamento parece não ter fim. Enquanto o país está fervendo por causa da Copa do Mundo, que começa em 11 de junho, o clima em Orânia está frio, até gelado. Sabe como seria se o Brasil sediasse o próximo mundial de curling? É mais ou menos assim que está o clima do povo de Orânia para a copa. "Acho que algumas pessoas vão assistir os jogos pela televisão.

terça-feira, 4 de maio de 2010

TROPAS DOS EUA: AÇÃO SEM FRONTEIRAS - 9º Ano

A presença de tropas dos EUA em países como Haiti, Afeganistão e Iraque não são novidades no cenário internacional. As ações militares do país no exterior começaram no século XIX e já ultrapassam a marca de 100. Inicialmente restritas às Américas e ao oceano Pacífico, ampliaram-se após a II Guerra e se aceleraram após a queda do Muro de Berlim (1989) e, ainda mais, com a chamada Guerra ao Terrorismo, depois dos atentados de 11 de setembro de 2001.
As raízes históricas dessa política externa estão no século XVIII. Em 1776, a então colônia britânica se declarou independente e foi à guerra contra a Inglaterra, que derrotada, reconheceu a independência em 1783. A Constituição norte-americana entrou em vigor em 1789. Nas décadas seguintes, duas prioridades foram definidas para a nação: desenvolvimento econômico e expansão territorial.
Inicialmente, os EUA eram formados pelas 13 colônias da costa leste, povoadas e organizadas. Com a conquista dos imensos e distantes territórios do Oeste (o “Far West”), entre 1778 e 1848, formou-se uma nação de proporções continentais.
Para se fortalecerem contra ingerência européia, os EUA passaram a anexar novos territórios. Em 1803 compraram da França a Louisiana. Em 1819, a Flórida foi adquirida da Espanha.
Novo e vitorioso conflito contra a Inglaterra, entre 1812 e 1814, gerou o sentimento de que os EUA tinham uma “predestinação”. Criou-se o mito de que o Estado norte-americano se formou com a ação de homens excepcionais (os “founding fathers”, ou “pais fundadores”) predestinados a erguer uma sociedade sem igual no mundo, colonizado e civilizando novos territórios.
Essa concepção, conhecida como “Destino Manifesto”, preconizava a tomada de toda a América do Norte. No século XIX, 4,5 milhões de pioneiros cruzaram a região dos Apalaches, povoando grandes espaços do Oeste. Entre 1846 e 1848 ocorreu a guerra contra o México, com a tomada do Texas e dos territórios da atual Califórnia, Novo México, Arizona e porções de Oklahoma, Colorado, Idaho e Utah. Na Califórnia foi descoberta jazidas de ouro, o que iniciou, em 1848, uma gigantesca corrida à região. Aventureiros povoaram vastas porções de terras indígenas, e os EUA estenderam suas fronteiras à costa do Pacífico à costa do Pacífico. Em 1867, a expansão chegou ao Alasca, comprado da Rússia.

Doutrina Monroe

Na década de 1820, o presidente James Monroe criou a Doutrina Monroe, cuja máxima era “a América para os americanos”. Os EUA não interviriam nos negócios europeus, mas não admitiriam interferências no continente norte-americano. Os EUA se propunham a assumir um papel de liderança sobre toda a América, o que viria a nortear sua futura política externa.
No fim do século XIX, países como Inglaterra, França e Alemanha, entre outros, ainda controlavam amplos territórios em vários continentes. Os EUA emergem, então, como uma nova potência com presença militar no exterior. Em 1898, o Havaí foi anexado, e, na guerra contra a Espanha, foram conquistados territórios no Caribe (Cuba e Porto Rico) e no Pacífico (Filipinas e Guam). Cuba ganhou independência em 1902. Em 1903 forçaram a independência do Panamá diante da Colômbia, para obter a posse da Zona do Canal, que liga o Atlântico ao Pacífico.
O “Big Stick”

O governo de Theodore Roosevelt (1901 – 1909) retomou a Doutrina Monroe, determinando prioridade para os interesses dos EUA na América Latina. Essa política do “Big Stick” (grande porrete) levou às intervenções armadas, no início do século XX, em Cuba, na Nicarágua, no Haiti e na República Dominicana, entre outras.
A entrada dos EUA na I Guerra, em 1917, ao lado do Reino Unido e da França, foi decisiva para a vitória dos Aliados. Na II Guerra, os EUA se envolveram após o ataque japonês à base de Pearl Harbor, no Havaí, em 1941. Foram determinantes para a vitória aliada em solo europeu e, em 1945, lançaram bombas atômicas sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, o que marcou o fim da guerra. Tornaram-se a grande potência ocidental, dividindo sua influência no mundo com a União das Républicas Socialistas Soviéticas (URSS). Era o começo da Guerra Fria.
Nesse novo contexto, os EUA enviaram tropas à Coréia do Norte, em 1950, para conter os comunistas. O conflito durou três anos. Em 1961, os EUA entraram no Vietnã, contra os rebeldes comunistas, e daí só se retiraram em 1973. Incentivaram e apoiaram ativamente ditaduras militares na América do Sul nas décadas de 1960 e 1970. Nos anos 1980 fizeram intervenções com tropas ou ataques militares em Granada, na Líbia, no Panamá e no Irã.

Doutrina Bush

A queda do Muro de Berlim (1989) e o fim da URSS (1991) puseram fim à Guerra Fria. Os EUA tornaram-se a única superpotência do planeta. Em 1991, o presidente norte-americano George Bush (pai doa atual, George W. Bush) organizou uma coalizão militar que expulsou as tropas iraquianas do Kuweit. Desde então, tropas dos EUA realizaram intervenções ou taques em quatro continentes: na África (Somália, em 1992-1994, e Sudão, em 1998), nas Américas (Haiti, em 1994-1995 e em 2004), na Europa (ex-Iugoslávia, em 1999) e na Ásia (Afeganistão, em 1998 e 2001, e Iraque, em 2003). As atuais intervenções dos EUA no Iraque e no Afeganistão se enquadram na Doutrina Bush, pela qual o país se dá ao direito de agir preventivamente contra potenciais adversários, mesmo sem o aval de organismos multilaterais, como a Organização das Nações Unidas (ONU).

O RACISMO NA EUROPA OCIDENTAL -8º e 9º Ano ; 2ª Série

Toda migração gera conflitos. O interesse próprio e a xenofobia são uma constante na humanidade, mais antigos que todas as sociedades conhecidas. Tomemos como exemplo dois passageiros numa cabine de trem. Eles se apossam das mesinhas, cabides e bagageiros, ocupam os assentos vazios e se instalam à vontade. Mas a porta se abre e surgem dois novos passageiros. Aqueles dois primeiros, mesmo que não se conheçam, comportam-se com uma solidariedade notável: há uma nítida relutância em desocuparem os demais assentos e deixarem os recém-chegados também se acomodarem. A cabine do trem tornou-se território seu, para disporem dele a seu bel-prazer, e cada novo passageiro que entra é considerado um intruso.
Na prática, essa situação nunca chega ao conflito aberto, pois os passageiros estão sujeitos a um sistema de regras. Mas até mesmo os dois últimos passageiros, que conheceram certa dificuldade de acomodação, no caso de chegarem mais dois posteriormente, vão adotar a mesma atitude preconceituosa dos primeiros.
Hoje em dia estima-se que vivam na Europa ocidental mais de 20 milhões de imigrantes. Muitos europeus acreditam que suas vidas estão ameaçadas. “Os alemães (ou franceses, suecos, italianos) estão se extinguindo”, ouve-se. Sabidamente os imigrantes mais bem qualificados encontram menos barreiras. O astrofísico indiano, o famoso arquiteto chinês, o negro africano ganhador do prêmio Nobel são todos bem-vindos a qualquer lugar do mundo. Afinal, os ricos jamais são mencionados nesse contexto; ninguém questiona sua liberdade de movimento. Para um empresário de Hong Kong, adquirir um passaporte britânico não constitui um problema. A cidadania suíça também é, para imigrantes de qualquer origem, apenas uma questão de preço. Os estrangeiros são mais estrangeiros quando são pobres.
A Alemanha é um país que deve sua população atual a gigantescos movimentos migratórios. Desde os tempos remotos tem havido uma troca constante de grupos populacionais, pelas mais diversas razões. Os alemães, assim como os austríacos e outros, são uns povos bastante diversificados. O fato de as ideologias raciais ganharem credibilidade justamente ali pode ser visto como uma espécie de compensação para amparar uma identidade nacional particularmente frágil. A idéia de “raça ariana” ou alemã nunca passou de uma construção risível. É espantoso que uma população assim possa ser vítima do atual pavor – e racismo – diante do imigrante. É como se os alemães tivessem a mesma atitude mencionada no exemplo da cabine do trem. Eles são na verdade os recém-chegados que, tendo já garantido seu próprio assento, insistem em desfrutar dos pretensos direitos daqueles que sempre estiveram lá e se incomodam com a vinda de novos recém-chegados.
A xenofobia, a aversão pelo estrangeiro, evidentemente não é um problema exclusivamente alemão. Por toda a Europa, e até no Japão, assiste-se à multiplicação de grupos racistas. A questão básica é: Quantos imigrantes um país é capaz de acolher? Na realidade, os conflitos inevitáveis que emergem com a migração em grande escala intensificam-se quando existe desemprego em massa.
Em épocas de pleno emprego, que provavelmente nunca mais retornarão, milhões de trabalhadores estrangeiros foram recrutados. Dez milhões de imigrantes foram do México para os Estados Unidos, 3 milhões da África do Norte para a rança, 5 milhões para a Alemanha, incluindo aqui cerca de 2 milhões de turcos... Nesse momento, a imigração não foi apenas tolerada, mas incentivada.
Essa atitude mudou quando aumentou o desemprego. Por longo tempo os recém-chegados mostraram-se ávidos por adaptar-se. Eles aceitaram as normas escritas e os costumes da sociedade que os acolheu, mesmo continuando em parte aferrados às suas tradições culturais e religiosas. Hoje em dia essa atitude está mudando.
A pobreza e a discriminação induzem cada vez mais os imigrantes, legais ou clandestinos, a insistirem na sua “identidade”. Porta-vozes ativistas fazem reivindicações de separatismo. Por vezes as palavras de ordem do grupo recaem nas idéias de uma “nação negra”, uma “nação islâmica” e assim por diante. Mesmo que a disposição dos imigrantes para a integração esteja diminuindo, não são eles os provocadores, mas, ao contrário, são os chamados nativos. Se ao menos os “nativos” fossem somente os skinheads ou os neonazistas! Mas essas gangues representam unicamente a parcela violenta que se arrogou o posto de vanguarda da xenofobia. A meta da integração ainda não foi aceita por boa parte da população européia.
Para eliminar as causas das migrações internacionais seria necessário reduzir drasticamente as diferenças entre os países ricos e os pobres. Mas isso parece estar além das possibilidades atuais. Outra questão é preservar as condições mínimas para uma verdadeira civilização democrática: que toda pessoa possa escrever ou dizer em voz alta o que pensa do governo, do país ou de Deus, sem ser presa nem ameaçada de morte; que as desavenças sejam resolvidas no tribunal e não com uma rixa entre grupos; que as mulheres possam movimentar-se livremente e não sejam obrigadas a vender-se ou ser circuncidadas; que toda pessoa possa atravessar a rua sem ser metralhada no tiroteio de uma soldadesca turbulenta. Na história da humanidade, essas condições mínimas foram apenas excepcionalmente e em caráter temporário alcançadas. Todos aqueles que desejam preserva-las de ameaças externas se defrontam com um dilema: quanto mais ferozmente uma sociedade se defende e ergue barreiras à sua volta, menos, no final, sobra para defender. E, quanto aos bárbaros, não precisamos esperá-los nos portões. Eles sempre já estão entre nós.

Questões:

1. O que é xenofobia?

2. O que o autor quis dizer com sua frase final: “Quanto aos bárbaros, não precisamos esperá-los nos portões. Eles sempre já estão entre nós”?
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NATUREZA EM ALERTA - Olimpíada da Geografia

As encostas vêm abaixo e as cidades alagam, devastadas por chuvas torrenciais, porque sofrem a ação descuidada do homem. Isso ressalta a importância de construir uma casa que siga a legislação e seja sustentável e segura
Bruno Versolatto

Revista Arquitetura & Construção – 03/2010

As chuvas que castigaram o Sul e o Sudeste do país neste verão foram diferentes das de anos anteriores: eventos extremos, Segundo o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da Organização das Nações Unidas (IPCC). Em Angra dos Reis, RJ, mediram-se mais de 430 mm em três dias. Isso significa despejar 430 litros de água por m2 de terra. Cunha, SP, outra cidade solapada nesta temporada, recebeu 183 mm num só dia. “Se as chuvas se confirmarem mais fortes nos próximos anos, teremos um desafio para a engenharia e os legisladores.
Muita coisa vai ter de mudar”, diz Maria Lucia Refinetti Martins, arquiteta e urbanista da Universidade de São Paulo (USP). “A verdade é que vamos precisar de alguns anos para entender o que aconteceu nesse período”, afirma Luis Fernando Pesqueiro, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais(Inpe), com sede em São José dos Campos, SP. Ele se refere aos ciclos de 30 anos em que se define um novo padrão climatológico (usado depois para redimensionar calhas e galerias de água pluvial, por exemplo). “Todas as décadas apresentam alguns verões problemáticos.
Não dá para alterar regras a todo momento”, fala Luis Fernando. Para além das discussões sobre clima, a questão diz respeito à vontade política de fazer valer o uso adequado do solo. “Em todos os casos de tragédia, vemos um vetor: a ocupação irregular.
As regras para isso precisam ser mais rígidas e, eventualmente, áreas de risco e de várzea devem ser desocupadas”, defende Fernando Almeida, engenheiro licenciado do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe),do Rio de Janeiro. Se as prefeituras acham difícil legislar sobre a ocupação do próprio solo, elas vão ainda mais longe quando deixam de cumprir leis federais valorosas para disciplinar a ocupação e a ordenação do município.

Talude: Desnível com segurança

A capital paulista, aliás, é outro caso flagrante de desatenção às leis vigentes. Durante a implantação do projeto para ampliar a calha do rio Tietê, concluído em 2006, verificou-se que a vazão prevista ao fim da obra já não daria conta. Isso se deve, em grande parte, ao fato de que, em 15 anos, a cidade havia crescido além do planejado. “Surgiram loteamentos que não respeitam os conceitos básicos de ocupação do solo”, explica Júlio César Cerqueira César, professor aposentado de hidráulica da Escola Politécnica da USP e consultor em engenharia. O problema se avoluma, considerando-se o que ocorre em pequena escala: aqui e ali despontam casas que driblam as leis e sua fiscalização, ‘roubam’ metros de recuo, pavimentam em excesso, retiram árvores.
A cada ano, a impermeabilização crescente da cidade faz com que qualquer chuva chegue rapidamente aos cursos de água, que, assoreados, transbordam. O resultado é um conjunto urbano impraticável e, muitas vezes, inseguro. Enquanto isso, arquitetos do mundo todo adaptam seus projetos. “Estamos discutindo quanto os oceanos vão subir e como as chuvas vão se comportar”, diz Stephen Schneider, professor de estudos ambientais da universidade americana de Stanford. Na cidade de Nova Orleans, as casas estão sendo erguidas a 1,20 m do chão, a salvo de enchentes. Por aqui, a ação do Estado pode e deve se somar a pequenos gestos: cada um tem de cuidar bem da sua cidade, dar destino certo ao lixo e garantir que sua moradia cumpra a legislação e seja ambientalmente correta e segura.

Veja por onde começar:

A COMPRA DO TERRENO

- “O ideal é eleger quatro ou cinco lotes e levar um engenheiro de confiança para escolher o melhor”, orienta José Augusto Vianna, presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis de São Paulo (Creci-SP). Vale também conversar com vizinhos (bata à porta da casa mais nova, que provavelmente encontrou o solo em condição parecida com a atual) para descobrir se a rua alaga, se o esgoto volta quando chove muito e se houve dificuldade com as fundações. Saber isso é útil para decidir a compra e, depois, o projeto.
- Definido o lote, encomende uma análise de solo. “A sondagem custa cerca de R$ 100”, estima o arquiteto paulista Marcio Moraes. Nesse procedimento são analisadas amostras das diversas camadas de solo, da mais superficial à mais profunda. “Esses dados são fundamentais, servem de base para um projeto seguro”, diz ele. A sondagem também irá determinar se o terreno, caso seja muito úmido, precisa de drenagem lateral e vertical “Em lotes úmidos, deve-se adotar um sistema que escoe a água do solo para a rede de águas pluviais da cidade ou a destinação indicada no projeto”, completa Marcio. Há diversas opções, mas a avaliação compete a um especialista e deve ser feita caso a caso.
- A advogada paulista Daniela Libório, especialista em direito urbanístico, chama a atenção para o encaminhamento das águas. Quem vai comprar um lote em aclive, com vizinhos logo acima, deve verificar se eles providenciaram corretamente a captação e o encaminhamento das águas pluviais e do esgoto - que podem encharcar o quintal ou até desagregar camadas mais fundas do solo.
- Num loteamento, a checagem aumenta.“Para quem está de olho em um condomínio fechado, recomendo uma visita à prefeitura, para saber se o que está sendo vendido realmente existe, ao Ministério Público e ao Fórum – para checar se não há processos de ex-proprietários descontentes ou passivos ambientais”, relaciona Daniela. Esse tipo de busca pode revelar lotes em situação irregular, em várzeas, contaminados...

Muro de arrimo em etapas

CONSTRUÇÃO: DIÁLOGO COM O TERRENO

- Sobre a melhor forma de fazer uma casa em momento de clima tão extremo, a arquiteta e urbanista Maria Lucia é categórica: a obra precisa conversar com o terreno. “Parece que só existe um jeito de construir no país: cortar o terreno, fazer um platô e erguer em cima”, critica Ricardo Vasconcelos, arquiteto e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. Para ele, esse recurso é a última opção. “Uma casa erguida num lote inclinado deve ser elevada por pilastras. Só a fundação precisa tocar o solo”, diz Ricardo. Caso a declividade seja baixa, o projeto pode ser feito em escadinha. Vale lembrar que a legislação não permite construir em áreas de inclinação maior que 45 graus – Santos, SP, restringiu esse número para 30. “O código civil estabelece esses limites para evitar riscos”, diz Daniela Libório. “Em terrenos inclinados, a recomendação é que o vizinho de cima construa a pelo menos 5 m da beira do talude e o de baixo, a 10 m.” Apesar disso, cada condomínio ou cidade estipula o que é adequado ao local. E essas medidas ainda variam conforme o imóvel, o solo e a fundação – só um arquiteto ou um engenheiro podem avaliar o caso.
- O que ocorre, na prática, é que muitas pessoas optam por fazer pequenas movimentações de terra. “A encosta é estável até ter seu desenho alterado pelo homem. Se isso ocorrer sem critério, a natureza força um redesenho do morro, o que pode gerar, por exemplo, deslizamentos”, alerta Marcio Moraes. Isso sem falar do efeito cascata: uma má decisão do vizinho pode impactar casas próximas, uma cidade mal planejada pode castigar áreas imensas. Essa é a razão pela qual muitos especialistas torcem o nariz para cortes e muros de arrimo. Para quem precisa desses recursos, porém, a professora de engenharia civil Mércia Bottura de Barros, da Escola Politécnica da USP, avalia que as contenções com até 2 m são obras simples – mas devem ser realizadas por equipe especializada. “Um bom arrimo deve levar em conta o tipo de solo e também o que há em cima, como cursos de água e a carga a que o terreno é submetido no topo.” Ou pode colapsar. “Existem especialistas em solo, geotécnica, fundações. Contratá-los pode não ser barato, mas é imprescindível”, endossa Marcio.

VOCE CONHEÇE AS MICROBACIAS FLUVIAIS?

Em cidades cada vez maiores e mais cimentadas, é raro encontrar quem saiba da presença de pequenos rios. Afinal, muitos estão canalizados ou aterrados. Mas entender por onde passa (ou passava) a rede de córregos na sua região, bairro ou município é extremamente importante.
“Os topógrafos costumam ter as cartas que detalham as microbacias”, diz o arquiteto paulista Ricardo Vasconcelos. Consultá-las é um recurso valioso. Isso porque há locais onde os cursos de água foram cobertos muitos anos atrás, mas, quando chove, eles voltam à ativa.
A água tende a escoar por onde é mais fácil – exatamente esse conjunto de antigos vasos fluviais. Mais do que uma cena idílica, esse fenômeno pode causar problemas a quem vive no local ou está interessado em construir ali. “Numa rua do Jardim Paulista, bairro nobre de São Paulo, havia um curso de água, hoje aterrado. Quando chove muito, as ruas próximas conduzem a água em sua direção, e tudo se acumula numa pracinha. Os carros saem boiando”, exemplifica Ricardo. “O lote pode ser ótimo, assim como a localização, mas há que considerar esse fator”, alerta o profissional.

DE OLHO NO FUTURO: CASAS MAIS VERDES

Além de desenhar uma construção que respeite o terreno, há uma série de medidas que podem ser incorporadas ao projeto (de construção ou reforma) e colaboram bastante com o meio ambiente. Especialistas recomendam que, independentemente da técnica construtiva, se faça da moradia uma espécie de esponja temporária para as águas da chuva. “Quanto mais demorar para que elas cheguem ao leito de um rio, melhor para a cidade”, diz Maria Lucia Refinetti Martins. “Em São Paulo,costuma-se cimentar o quintal. Isso só aumenta a impermeabilidade”, afirma. Outras medidas sustentáveis compreendem adotar pisos drenantes (que deixam a água penetrar) ou do tipo pisograma (de cimento, com cavidades para o plantio) nas áreas externas – em que é permitido pavimentar.
Considere instalar uma cobertura verde (feita com substrato e vegetação) sobre a laje ou sobre o telhado. Existem kits próprios para isso vendidos prontos, além de soluções personalizadas que podem ser encomendadas a um arquiteto. Vale lembrar que esse mesmo recurso ainda pode ser associado a algum sistema de captação de água da chuva – armazenada em uma cisterna (espécie de piscininha) e reutilizada em descargas e na lavagem de pisos e carros, ou liberada, depois, à rede pública. A reportagem da página 58 traz um exemplo disso. Outra recomendação diz respeito às plantas. Jardineiras nas janelas ajudam a absorver água, árvores no jardim – de pequeno porte e sem raízes agressivas (como várias frutíferas) –, idem.

ENERGIA ALTERNATIVA - Olimpíada da Geografia

EUA investirá em asfalto solar

O Departamento de Transportes dos EUA anunciou que pretende substituir o asfalto comum das rodovias do país por painéis solares, para reduzir o uso do petróleo e, ainda, produzir energia limpa
MarciaBindo
Revista Vida Simples – 01/2010
Os raios de Sol que fazem ferver o asfalto das estradas agora podem ter melhor serventia para os motoristas. O Departamento de Transportes dos EUA resolveu investir na criação de painéis solares para substituir a pavimentação das rodovias do país. Além de diminuir o consumo de petróleo, os painéis (de 4m2) concebidos pela empresa Solar Roadways são feitos de material reciclado (vidro, plástico e borracha) e células solares que captam a luz do Sol e a transformam em energia para – literalmente – iluminar a pista. Com luzes de led embutidas (como o protótipo acima), eles vão funcionar como um sistema inteligente para indicar as faixas de sinalização e até alertas sobre o que o motorista deve encontrar à frente – se há obras, curvas acentuadas ou as condições das estradas. “A energia captada fica armazenada por bastante tempo nas células e ajuda a derreter as camadas de neve que se formam sobre as estradas em dias de frio intenso”, afirma Scott Brusaw, criador do projeto. Os painéis ainda estão sendo testados, mas, se tiverem bons resultados, a ideia é substituir todas as vias americanas pelo “asfalto solar”. “Como cada painel produz cerca de 7 kW de energia por hora, se cobrirmos todo o nosso sistema viário, podemos suprir a necessidade energética de todos os Estados Unidos sem depender de outras fontes de energia nem causar impacto no planeta”, diz Brusaw. Sem dúvida, é mesmo um ótimo caminho para seguir.